Ópera poeira & A catedral dos porcos
Ópera poeira & A catedral dos porcos
A palavra como arma: a dramaturgia poética de Jean D’Amérique. Traduzidos por Prisca Agustoni, o volume integra ainda um prefácio de Leda Maria Martins.
Duas peças de Jean d’Amérique — Ópera poeira e A catedral dos porcos — se encontram neste livro para revelar a potência de uma escrita que entrelaça poesia, política e urgência histórica. O dramaturgo, poeta e romancista haitiano, uma das vozes mais contundentes da literatura contemporânea, nos apresenta dois textos onde poesia e teatro deixam de ser territórios apartados e confluem em grito, rito e insurgência, afirmando, sem concessões, a dimensão da arte como gesto de resistência.
Ópera poeira
Sanite Bélair (1781-1802), sargenta e, posteriormente, tenente do exército revolucionário haitiano, foi capturada pelos colonizadores franceses e fuzilada aos 21 anos de idade, apenas um ano antes da batalha final que levaria à Independência do Haiti. Em Ópera poeira, essa combatente da resistência injustamente esquecida decidiu voltar dos mortos para lançar o movimento #HEROINASemfúria nas redes sociais, a fim de reivindicar seu lugar na história, entre os “pais” de sua terra natal. O dramaturgo, romancista e poeta haitiano Jean D’Amérique alterna cenas líricas e cotidianas para conectar o mundo da poeira ao mundo de hoje, tentando reparar a negligência do passado. Ele ressignifica Sanite Bélair em um novo modelo de resistência contra todas as formas de opressão e dominação graças a um texto coral, poderoso e poético, repleto de energia e humor — uma mistura de ritualidade vodu e universo digital.
A catedral dos porcos
Da cela de uma prisão haitiana, uma voz ecoa. Ela descreve, de um só fôlego, as mazelas do país: a pobreza, a fome, as catástrofes naturais, a corrupção no poder e a hipocrisia da igreja. É um grito. Um poema dramático que não busca estetizar a miséria e a violência política, porque o poeta as está vivendo, das profundezas de sua masmorra em Porto Príncipe. Suas palavras aprisionadas ressoam ainda mais por terem sido desprezadas, impedidas e retidas. Extremamente teatral em sua oralidade e ritmo, o grito de Jean D’Amérique ecoa o de outros poetas presos, do passado e do presente: Federico García Lorca, Aslı Erdoğan, Nâzım Hikmet... e a força de suas palavras o coloca ao lado da subversão de Jean Genet e da energia de Aimé Césaire.
Reunidas, essas duas obras oferecem um retrato visceral da condição humana diante da opressão, ressignificando o teatro como território de luta, memória e poesia.
“Ópera poeira e A Catedral dos Porcos nos revelam um escritor habilidoso, perspicaz, agudo, versátil, cujos textos deslizam entre a letra lírica e a mais contundente prosa, e nos quais a palavra se faz como corpo de memória e arauto da história. Textos que se ancoram na palavra proferida, na qual se performam as gravuras da voz. Aqui a palavra se metamorfoseia em palavra suporte, palavra canto, palavra potência, palavra gesto, tradução do imaginário, rítmica de um repertório de modulações e de movimentos da linguagem poética, instrumento poderoso para alçamento do que a escrita, na sua qualidade de dicção insurgente, pode também almejar, estimular e agenciar: a transformação desejada dos cenários de opressão.”
Leda Maria Martins
Sobre o autor:
Nascido em 1994, em Côte-de-Fer (Haiti), Jean D'Amérique é poeta, dramaturgo, romancista e diretor artístico do festival Transe Poétique (Porto Príncipe). Ele ministra oficinas de escrita, colabora com diversas revistas literárias e realiza performances para dar voz a seus textos poéticos. Publicou as coletâneas de poesia Pequena flor do gueto (Atelier Jeudi Soir, 2015); maelstrÖm reEvolution (2019), que recebeu uma menção especial no Prêmio René Philoctète, Nenhum caminho na pele além do abraço sangrento (Cheyne, 2017), vencedora do Prêmio de Poesia da Fundação Marcel Bleustein-Blanchet, Ateliê do silêncio (Cheyne, 2020), vencedora do Prêmio Apollinaire Revelação 2021 e do Prêmio Heather-Dohollau 2022, Rapsódia vermelha (Cheyne, 2021), vencedora do Prêmio Fetkann! Maryse Condé de la Poésie 2021 e do Prêmio Heredia 2022 da Academia Francesa e Algum país entre meus prantos (Cheyne, 2023).
Sua peça A catedral dos porcos (Éditions Théâtrales, 2020), finalista do Prêmio Sony Labou Tansi dos Estudantes 2022, foi premiada com o Prêmio Jean-Jacques Lerrant (Journées de Lyon des Auteurs de Théâtre) e obteve um apoio à criação (Artcena, 2020); além disso, foi objeto de várias leituras em diversos festivais na França e no Haiti, e foi estreada pelo próprio autor, em 2023, na Comédie de Caen (França).
Seu texto para o público infanto-juvenil, Rachida de pé (Cheyne, 2022), escrito para o espetáculo Para amanhã, juntamente com textos de Sylvain Levey e Mariette Navarro, foi estreado por Émilie Le Roux como parte do programa infantil do Festival de Avignon (França, 2021).
Sua peça Ópera poeira (Éditions Théâtrales, 2022), premiada com o Prêmio RFI Théâtre 2021 e o Prêmio Jacques Scherer 2022, foi encenada em inúmeros festivais e teatros entre 2021 e 2022, tais como as Comédies de Caen e Reims, o Theatro de Liège, o Teatro Nacional D. Maria II de Lisboa, o Festival Quatre Chemins (Port-au Prince) e o Festival de Avignon.
Seu primeiro romance, Sol descosturado (Actes Sud, 2021), foi vencedor do Prêmio Dubreuil Primeiro Romance da SGDL (2021) e do Prêmio Montluc Resistência e Liberdade (2022).
Seus livros encontram-se traduzidos e publicados em alemão, inglês, crioulo haitiano, espanhol e português.
Outros títulos do autor publicado pela Ars et Vita:
- Algum país entre meus prantos & Rapsódia vermelha (2025)
- Sol descosturado (2025)
Ópera poeira & A catedral dos porcos
Autor: Jean D’Amérique
Prefácio: Leda Maria Martins
Tradução: Prisca Agustoni
Design gráfico e diagramação: Marcello Kawase
Editora: Ars et Vita
Ano: 2025
Formato: 18 x 24 cm
104 páginas
ISBN: 978-85-66122-29-9
R$78,00